Monday, February 11, 2013

Castelo de São Jorge III: digo o nome da cidade, digo para ver



Digo:
“Lisboa”
Quando atravesso – vinda do sul – o rio
E a cidade a que chego abre-se como se do seu nome nascesse
Abre-se e ergue-se em sua extensão noturna
Em seu longo luzir de azul e rio
Em seu corpo amontoado de colinas –
Vejo-a melhor porque a digo
Tudo se mostra melhor porque digo
Tudo mostra melhor o seu estar e a sua carência
Porque digo
Lisboa com seu nome de ser e de não-ser
Com seus meandros de espanto insónia e lata
E seu secreto rebrilhar de coisa de teatro
Seu conivente sorrir de intriga e máscara
Enquanto o largo mar a Ocidente se dilata
Lisboa oscilando como uma grande barca
Lisboa cruelmente construida ao longo da sua própria ausência
Digo o nome da cidade
- Digo para ver

Sophia de Mello Breyner Andresen






























Monday, February 4, 2013

Castelo de São Jorge I: gosto do céu e do chapéu




Castelo de São Jorge, Lisboa.

♪ Gosto da Cidade/Marianna e Chamily, A Naifa ♪


Quando chove em Lisboa chove a sério. É uma chuva molhada. Não há como escapar, não há guarda-chuva que aguente. Chove como só a chuva de Lisboa sabe chover. Não é como aqui em Bruxelas, onde a chuva é sempre miudinha, onde a chuva miudinha nunca pára realmente de chover.

A chuva em Lisboa há-de parar. Sabemos mais ou menos quando vai parar, e esperamos que ela pare debaixo das varandas ou nos cafés. Naquele dia esperámos na Igreja de Santa Luzia, eu e os amigos estrangeiros de visita a Lisboa pela primeira vez. Caía um dilúvio em Junho. Estava calor. Depois a chuva parou, e continuámos a subida.

Pelo meio ainda apanhámos um aguaceiro. Tive de comprar um guarda-chuva numa loja de recordações para os turistas. Custou-me seis euros. Ainda o uso, é verde e tem um botão de abertura automática. Hoje levei-o comigo dentro da mala, mas para esta chuva miudinha de Bruxelas basta-me o gorro ou o capuz do impermeável.

Depois o aguaceiro passou e, lá em cima no castelo, o sol apareceu. Como só o sol de Lisboa sabe aparecer.